Sempre que escuto alguém falar de música de "qualidade", música "boa", em comparação com alguma outra forma de música considerada "ruim" ou de má qualidade, eu começo a pensar em comida.
Não exatamente porque esteja com fome, mas porque, pelo alto grau de subjetividade envolvido no ato de comer e ouvir música, as classificações tornam-se praticamente inúteis e com doses de prepotência intelectual e gastronômica/cultural.
Ultimamente por exemplo, tenho lido em vários jornais e revistas que a bossa nova seria uma forma de música hierarquicamente superior à música sertaneja, considerada por experts como uma forma brega, harmonica e melodicamente pobre, e portanto, sem valor.
Voltando as comidas então, quem em sã consciência poderá afirmar que um prato feito com escargots e trufas seja superior ao angu do Gomes por exemplo? Como se comparar dois tipos de alimentos tão distintos? Quer dizer que se eu gosto de angu (aliás, não gosto) mas não aprecio escargots, isso significa que não entendo de culinária e que não sei o que seja a boa comida?
Nunca é tarde lembrar que, tanto para ouvir música quanto para comer, não é necessário conhecimento intelectual algum. O sujeito prova o alimento, e gosta ou não gosta. Ele ouve uma música, ela faz bem a ele ou não faz.
Obviamente que o aspecto da cultura em que esse sujeito vive influenciará seus gostos individuais, e que alguns alimentos (como vinagre, por exemplo) necessitam de algum tempo para serem devidamente aceitos pelas papilas gustativas do sujeito. O mesmo, óbvio, vale para os ouvidos. Algumas músicas de fato necessitam de mais tempo para serem assimiladas. Mas tanto pode ser uma do Tonico e Tinoco quanto alguma sinfonia dodecafonica de Schoenberg.
Quem assistiu ao filme sobre Zezé de Camargo e Luciano, deve ter percebido, entre vários outros aspectos, que a música sertaneja está totalmente embebida na cultura daquelas regiões, faz parte dos hábitos e modos de ser de uma enorme quantidade de brasileiros. E mais, ela é tão brasileira quanto o samba, o forró e a bossa nova.
Assim, supor que a bossa nova é "superior" a música sertaneja é o mesmo que supor ser o escargot um alimento "superior" ao angu, porque o processo de cozimento é mais sofisticado ou qualquer outra forma de explicação racionalizada.
Nessas horas me vem a cabeça as classificações feitas pelos colonizadores europeus na África, no século XIX. Quando referiam-se aquelas culturas usavam termos como, selvagens, primitivas, e que por estarem em um estágio de desenvolvimento abaixo dos padrões europeus necessitavam de um aprendizado para deixarem de ser selvagens e tornarem-se civilizados.
Esta forma de pensar que ficou conhecida como etnocentrismo, hoje em dia não é muito bem vista pelo mundo afora, então para quê sermos etnocentristas culturais, musicais ou culinários?
quarta-feira, 19 de março de 2008
terça-feira, 4 de março de 2008
Músicos e artesãos
Durante o período histórico que ficou conhecido como Idade Média, a produção de bens manufacturados e produtos necessários a existência dos homens era atributo dos chamados artesãos.
O volume desta produção era baixo, uma vez que os processos produtivos em larga escala só surgiriam com a revolução industrial,que teria seu inicio, grosso modo, a partir de meados do século XVIII.
Esta classe de profissionais portanto, não resistiu a brutal competição produtiva iniciada com a modernização dos modos de produção, e em 100 anos, era uma categoria praticamente extinta da Europa do século XIX.
Mas o que teriam os artesãos extintos a ver com a musica do século XXI? bem, quase nada, a não ser que é bem possível que pelo andar da carruagem, em 100 anos os músicos sejam os artesãos extintos dessa nossa era pós-moderna!
Os músicos e espetáculos ao vivo sempre existirão, obviamente, mas cada vez mais relacionados a um grande patrocinador, e é fácil observar cada vez mais que até as casas de espetáculos de maior porte já tem em seu nome as marcas destas grandes empresas.
Quanto as pequenas casas, estão cada vez mais em menor numero, por fatores diversos, e não coloco o fator segurança entre eles de forma alguma. Observe-se que o show dos Rolling Stones na praia de Copacabana teve quase 1 milhão de pessoas na praia, o de Lenny Kravitz teve por volta de 300.000 e por aí vai.
A questão poderá estar mais relacionada ao fato de que o publico de uma forma geral, não sai mais de casa para ouvir musica, mas sim para ir a algum evento de musica, o que é parecido mas esta longe de ser a mesma coisa.
Dessa forma, eventos de musica produzidos de maneira empresarial tendem a ter uma grande quantidade de público, seja porque os artistas que se apresentam serem ainda “vacas sagradas” de uma outra geração (Bob Dylan, Roberto Carlos, Stones) seja porque os artistas envolvidos estejam no auge de algum sucesso radiofónico.
Assim, os espetáculos de música estão cada vez mais relacionados a alguma forma de patrocínio, sejam eles privados e/ou estatais, pois não existe , de uma forma geral, uma demanda "natural" para música ao vivo
Quanto a música produzida no varejo, com produções mais simples, em casas menores como clubes, teatros e bares em geral, por artistas também do “varejo”, esta se encontra no momento cada vez mais restrita, o que nos permite supor que, por estrita necessidade de sobrevivência e adaptação aos novos tempos, estes artesãos musicais tenham que buscar novas formas de ganharem seu dinheiro.
O volume desta produção era baixo, uma vez que os processos produtivos em larga escala só surgiriam com a revolução industrial,que teria seu inicio, grosso modo, a partir de meados do século XVIII.
Esta classe de profissionais portanto, não resistiu a brutal competição produtiva iniciada com a modernização dos modos de produção, e em 100 anos, era uma categoria praticamente extinta da Europa do século XIX.
Mas o que teriam os artesãos extintos a ver com a musica do século XXI? bem, quase nada, a não ser que é bem possível que pelo andar da carruagem, em 100 anos os músicos sejam os artesãos extintos dessa nossa era pós-moderna!
Os músicos e espetáculos ao vivo sempre existirão, obviamente, mas cada vez mais relacionados a um grande patrocinador, e é fácil observar cada vez mais que até as casas de espetáculos de maior porte já tem em seu nome as marcas destas grandes empresas.
Quanto as pequenas casas, estão cada vez mais em menor numero, por fatores diversos, e não coloco o fator segurança entre eles de forma alguma. Observe-se que o show dos Rolling Stones na praia de Copacabana teve quase 1 milhão de pessoas na praia, o de Lenny Kravitz teve por volta de 300.000 e por aí vai.
A questão poderá estar mais relacionada ao fato de que o publico de uma forma geral, não sai mais de casa para ouvir musica, mas sim para ir a algum evento de musica, o que é parecido mas esta longe de ser a mesma coisa.
Dessa forma, eventos de musica produzidos de maneira empresarial tendem a ter uma grande quantidade de público, seja porque os artistas que se apresentam serem ainda “vacas sagradas” de uma outra geração (Bob Dylan, Roberto Carlos, Stones) seja porque os artistas envolvidos estejam no auge de algum sucesso radiofónico.
Assim, os espetáculos de música estão cada vez mais relacionados a alguma forma de patrocínio, sejam eles privados e/ou estatais, pois não existe , de uma forma geral, uma demanda "natural" para música ao vivo
Quanto a música produzida no varejo, com produções mais simples, em casas menores como clubes, teatros e bares em geral, por artistas também do “varejo”, esta se encontra no momento cada vez mais restrita, o que nos permite supor que, por estrita necessidade de sobrevivência e adaptação aos novos tempos, estes artesãos musicais tenham que buscar novas formas de ganharem seu dinheiro.
terça-feira, 26 de fevereiro de 2008
Vamos gravar?
Hoje em dia, todo mundo pode gravar seu CD em casa não é? isso é ótimo não? democratiza os lançamentos...significa que o seu avô pode lançar seu primeiro trabalho, ainda que ele nunca tenha cantado ou tocado profissionalmente na vida. Assim, uma vez que o trabalho do seu avô esteja pronto, ele vai de uma forma ou de outra entrar no mercado do produto "musica".
Bem, amiguinhos, eu acho isso um autentico desastre! Porque? porque com a gravação digital, feita em computadores, perdeu-se um filtro natural que existia até o inicio da década de 90, ou seja, o sujeito pra gravar um disco, tinha que ter uma carreira anterior a esta gravação,ralar,tocar em roubadas as mais variáveis.
Se, de fato, a carreira musical fosse uma vontade concreta razoavelmente compativel com o talento do artista, este teria o ímpeto de continuar e prosseguir e com sorte, muita sorte, depois de uns 2 anos de ralação conseguiria gravar seu tao sonhado trabalho.
A principal vantagem desse processo "antiquado" é que assim, o mercado do produto "musica" fica muito mais desinchado, e só chega a gravar quem de fato tem algo a dizer, e quem de fato fez um longo aprendizado antes de se aventurar a gravar.
Alem disso, os cadernos culturais e revistas de musica em geral receberiam 50 vezes menos produtos gravados,o que tornaria muito mais factivel a audiçao de um novo trabalho.
Como é hoje em dia,o jornalista recebe 200 cds por semana, que evidentemente ele nunca irá escutar, com isso atrapalhando aqueles 15 a 20 caras ou moças,ou grupos que realmente tinham algo a dizer, mas que infelizmente, graças a democratica gravaçao digital, perderam-se no mar dos outros 180 aventureiros que gravaram tudo no pro tools!
Qualquer produto excessivamente produzido perde valor (considerando-se aqui excessivamente aquilo que é produzido acima da capacidade de demanda) e este é exatamente o caso com o produto "música".
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